Risco psicossocial no trabalho: quando sua carreira vira uma armadilha emocional

Imagine um relacionamento amoroso em que, mesmo com brigas constantes, você simplesmente não consegue sair. Algo o prende ali, uma mistura de esperança, medo e dependência. Agora, aplique essa mesma dinâmica ao seu trabalho. Parece exagero? Pois essa é a realidade emocional de muitos profissionais presos em ambientes de sofrimento, mas incapazes de se desligar. E é sobre isso que falamos quando abordamos o risco psicossocial no trabalho.

O que são riscos psicossociais?

Riscos psicossociais são condições organizacionais e relacionais que, ao se perpetuarem, comprometem a saúde mental e emocional do trabalhador. São fatores invisíveis que drenam a energia, minam a autoestima e podem desencadear transtornos como ansiedade, depressão, burnout e doenças psicossomáticas.

Vamos aos principais:

Teor do trabalho

  • Tarefas monótonas ou sem significado
  • Trabalho emocional excessivo (ex: lidar com sofrimento alheio diariamente)
  • Isolamento profissional

Carga e ritmo de trabalho

  • Fragmentação das atividades
  • Demandas excessivas
  • Alta pressão por produtividade
  • Jornadas prolongadas

Horário e controle

  • Escalas inflexíveis e imprevisíveis
  • Baixa autonomia
  • Subutilização de habilidades
  • Ambiente com alto grau de incerteza

Relações e cultura organizacional

  • Relações abusivas
  • Falta de apoio social
  • Conflitos interpessoais
  • Cultura de baixa escuta e pouca definição de metas

Desenvolvimento e papel

  • Ambiguidade ou indefinição de papéis
  • Estagnação ou promoções injustas
  • Remuneração inadequada
  • Insegurança no trabalho

Vida pessoal

  • Conflito trabalho-família
  • Baixo apoio no lar
  • Sobrecarga com dupla jornada

Esses fatores criam um cansaço que não é só físico: é existencial.

Por que então é tão difícil sair?

Aqui entra um outro elemento menos falado: as âncoras de carreira.

O termo foi cunhado por Edgar Schein, que definiu as âncoras como valores e motivações profundas que guiam as escolhas profissionais. Elas não são ruins por si só; ao contrário, são fontes de sentido e direção. O problema surge quando essas âncoras mantêm o indivíduo preso a um trabalho que já lhe faz mal.

As 8 âncoras de carreira:

  1. Autonomia e independência – valoriza liberdade no fazer
  2. Segurança e estabilidade – busca previsibilidade
  3. Competência técnica – prazer em ser especialista
  4. Competência gerencial – vocação para liderar
  5. Criatividade empreendedora – desejo de inovar
  6. Dedicação a uma causa – vontade de gerar impacto
  7. Desafio puro – busca por superação constante
  8. Estilo de vida – equilíbrio com vida pessoal

Sabe aquele profissional que sofre, mas diz “não posso sair, amo o que faço”? Ou “já estou aqui há anos, não posso jogar tudo fora”? Ou ainda “não sei fazer outra coisa”? Em muitos casos, ele está ancorado por esses valores, que funcionam como um laço afetivo e narcísico com o trabalho. Uma forma de dependência.

O ciclo emocional: do prazer à dependência

A relação com o trabalho segue fases semelhantes a um relacionamento amoroso ou mesmo ao uso de substâncias:

  1. Paixão – tudo é prazer, entusiasmo, identificação
  2. Início do amor – surgem os problemas, mas o prazer ainda prevalece
  3. Amor desapaixonado – visão mais realista, possibilidade de escolher seguir ou não
  4. Simbiose madura – relação equilibrada, com autonomia e respeito

O problema é que muitos trabalhadores ficam presos na fase dois, impedidos de enxergar com clareza. Sentem o desconforto, mas justificam. Se afastam da dor com racionalizações ou negações. As âncoras os mantêm ali, mesmo quando o trabalho já adoece.

Como romper o ciclo e cuidar da saúde mental?

  • Reconheça os sinais: cansaço crônico, irritabilidade, insônia, desmotivação, perda de sentido.
  • Reflita sobre suas âncoras: qual delas é mais forte em você? Ela está sendo nutrida ou explorada?
  • Busque apoio profissional: a psicoterapia ou acompanhamento psiquiátrico podem ajudar a clarear decisões.
  • Dialogue com sua rede: falar sobre o que sente ajuda a romper o ciclo de silêncio.
  • Permita-se questionar: você está onde está por escolha ou por medo?

Conclusão: você não está sozinho

Muitos profissionais passam por esse dilema, e não há vergonha em sentir-se preso. O importante é buscar consciência, apoio e alternativas. Trabalho não precisa ser fonte de sofrimento. Com informação, empatia e suporte especializado, é possível reconstruir essa relação.

Se você se identificou com este texto, talvez seja hora de dar um passo. Marque uma conversa com um profissional de saúde mental e avalie, com cuidado, o que você precisa para voltar a respirar.

Agende uma consulta com nossos especialistas. Estamos aqui para ajudar você a reencontrar o equilíbrio.